sexta-feira, 31 de maio de 2013

Eu ando sem paciência pro mundo. Rastejo, talvez. Não me importa mais se a caneta cai embaixo da cama porque ela continuará ali. Mantenho meus joelhos esticados em cima da cama. Não me importa mais o furo na carteira, o espelho fora do lugar, a mochila jogada em algum universo paralelo. As moedas atrás do sofá já formaram um real, e as cédulas foram pra máquina de lavar. A pasta juntou poeira. A lixeira anda cheia de papéis, quase como um porta-joias que pra mim, só pra mim, perderam o valor, enchendo as baratas com a poesia que perdi a vontade de apagar. Não me importa se faz frio, calor, se a janela fica aberta em dia de chuva, se como frango ou como peixe. O relógio ainda está atrasado. Ou adiantado, porque não lembro qual foi a última hora que me interessou. A folha do calendário ainda não foi rasgada, por mim ainda estaríamos em janeiro de um ano promissor. O marcador laranja daquele livro ainda está fincado no prefácio. Eu não entendo as piadas, não troquei as pilhas do controle remoto, não quis saber o que tinha na geladeira, não cumprimentei o rapaz que trabalha no caixa da padaria. Ele também esqueceu de sorrir pra mim. E eu esqueci de reclamar. O troco ficou com ele. De novo. O dinheiro que me pediram emprestado eu nunca liguei de cobrar. A música que parei na metade ainda não teve tempo de terminar. As maçãs do rosto apodreceram, eu sorrio sem pensar. Sorriso quebrado… E eu sem tempo pra consertar. Eu confundo mocinho com vilão, eu nunca mais assisti televisão. Eu não sei do que as pessoas falam e também já não sei o que falar. Eu não sei das pessoas, porque as pessoas não sabem de mim. Ou nunca souberam e eu não quis me importar. O celular tem três novas mensagens, mas foi um plano que eu esqueci de cancelar. Cansei de pegar o mesmo caminho de volta pra casa. Meu retorno não tem becos, mas não tem saída. Nunca teve um ladrão pra me assaltar. Talvez assim eu tivesse morrido, sem que eu implorasse pra alguém me matar. Mas eu não quero morrer. Eu nunca quis saber desse negócio de morrer, aliás. Eu não tenho paciência pra velório, eu nunca sei o que usar.
Cinzentos, “O céu não é quadrado como na televisão”

Parada

Eu vivo no banheiro da estação molhando a nuca quando está calor. No meio de centenas de esperas que não são minhas mas me esquentam. A moça que vende bilhetes é minha mãe. O cara da catraca meu amor. Sempre muda o cara da catraca. Mas eles se parecem justamente porque sempre mudam e porque são apenas o cara da catraca.Meu pai vende coisas coloridas de brincar e de sujar a língua aqui em frente e as crianças se distraem e sobrevivem. Meus amigos são os do vagão de antes e de depois. Os mais amigos, agora, são sempre os que acabaram de chegar. [...]
Estou na estação há tanto tempo. E sempre tem gente chegando e indo. E sempre tem amor e bala e dinheiro e cama e água e fins de tarde bonitos e brinquedos e catracas com a segurança de uma novidade de sempre. Em alguns momentos fica o equilíbrio terrível de nunca ir. Fica a dor terrível de todo mundo que foi. Fica a ansiedade terrível de todo mundo que tem pra chegar. Agora. Agora. A cada volta de uma piscada eu tenho minha esperança renovada. Mas nenhum desses silêncios chega perto do som que é viver ouvindo o mundo se locomovendo enquanto só tento enxergar de olhos bem abertos sem me mexer.
Estar no centro do barulho nunca foi realmente uma solidão. A troca é tão bonita porque sorrio achando todos tão corajosos com seus ternos e pastas e pressas e chegadas e "que mais". E eles sorriem de volta, me achando corajosa também em ficar. E só olhar. E poder amar esse trecho de vida deles ainda mais do que eles próprios que nem se percebem em trechos. [...]
Eu sou uma estação, é isso. Assim não dói além porque eu sei, desde o começo, que sou passagem. Então, vão, mas logo apita de novo. E é sempre movimentado, mesmo quando apagam as luzes e a vida dos outros descansa da minha parada. Existe o movimento que fica atrasado no ar e durmo embalada por tanta coisa que quase parece coragem...E eu pedi socorro. Eu não sei sair daqui mas quero ir com você. Eu tenho cinco anos de idade mas quero ir com você. Tudo me dói tanto e eu tenho tanto medo mas tudo bem, vamos lá. Na próxima parada só me lembra que é bom eu fazer xixi e comer alguma coisa porque tô te achando tão bonito que talvez eu esqueça.

Tati Bernardi

quarta-feira, 29 de maio de 2013

"Sem perceber meio percebendo, entrei no nosso ''jogo''.
Jogo é a palavra que mais chega perto de definir nossa relação. Jogo no qual joguei a moeda para o alto, você escolheu o campo, e eu fiz questão de rolar a bola. O que você não contava é que eu era uma ótima jogadora, conheço bem cada um dos seus truques e artimanhas, para falar a verdade, eles já estão até meio batidos. Sei me defender. Como qualquer jogo, nesse jogo também há torcidas. A torcida contra insiste em me dizer que este é um jogo perdido, e que eu deveria me dar por vencida. Aposto que eles dizem o mesmo a você. Mas será que devemos dar tamanha importância? Acho que não, afinal, somos jogadores profissionais e não vai ser esse o primeiro jogo no qual desistiremos.
E os jogadores do seu time? Que tanto insistem em tirar sua atenção de mim? Devo dizer de antemão que não adianta, é impossível que você deixe de prestar atenção na única pessoa que é capaz de te desafiar.
O juiz apita o “intervalo”, e a paz reina entre nós dois durante 15 minutos. Você tira a famosa frase da minha cabeça e me faz balançar, levitar, suspirar. Seu toque me trás arrepios, e sua voz borboletas no estômago, mas não. Jurei que não iria me entregar tão facilmente, eu não posso. Não posso.
“Inicio do segundo tempo”. Novamente vamos para lados opostos do campo e retomamos nossa batalha de egos. Eu contra esse sentimento que estava nascendo, e você contra o meu medo. Eu estava decidida a terminar de vez com essa partida, era muito simples. Eu ganharia, e você seria igual a todos os outros. Iria embora com todas suas mentiras, carinhos, e com a possibilidade de me vencer e convencer. Eu? Bem, eu ficaria apenas com as memórias criadas pela minha mente de como seria se ficássemos juntos, se nos permitíssemos. Enquanto planejava meu próximo movimento, escuto o apito. PENALTI!
Agora a decisão está em suas mãos. Só você pode acabar com esse jogo de uma vez por todas. Ficar para sempre ou ir embora sem olhar para trás? Decida se você quer rasgar a camisa do seu time e vir de encontro ao meu, me pedir que eu largue essa mania de jogar todos os fins de semana, e me convencer de que a vida não é só mais um jogo. Você prefere uma vida de disputa ou uma vida compartilhada ao meu lado? Sei que sou uma ótima adversária, mas te garanto, como companheira para a vida sou melhor ainda.
O juiz apita. Fecho os olhos. E aí, devo me amar ou me entregar?

De Isabela Freitas, para o melhor jogador que já conheci. É, você mesmo.
“E eu fui. Como um barquinho jogado na correnteza. Como uma pena solta ao vento. Como uma pipa perdida no céu. Fui sem destino. Sem caminho. Sem planos. Apenas fui. As dores que maltratavam meu coração deixei pra trás. Assim como todas as lembranças ruins. Não quero me lembrar de mais nada. Não quero viver do passado. Por isso decidi ir. Partir sem rodeios, sem despedidas, assim como todos que um dia me deixaram.”

A ETERNA FLUIDEZ, LIBERTINAR
“Mas a chuva
lava a rua
molha a casa
inunda a cidade
e não limpa
os pensamentos
que me invadem.”

CHOVE LÁ FORA
MAS QUEM TROVEJA
SOU EU.

SEVERINAR
❝Machado de Assis, em um de seus contos, compara felicidade a uma linda, rica e bem vestida moça, que se doa a quem quiser por um anúncio de jornal. Se tem pele de porcelana, sorriso branco feito neve, beleza quase divina, riqueza suficiente para o dote mais bem pago e a doçura de um anjo, porque é que se anuncia? Porque entrega-se tão facilmente ao primeiro sujeito que a responde o anúncio? Porque uma beleza tão rara como essa procura por um marido num simples folhetim? Só pode ser louca ou ter algum tipo de doença transmissível. Algum defeito essa mulher tem! Ou esconde algum segredo grave ou morre na próxima estação de algo incurável. Ou é uma assassina, maluca, possessiva. E então, é assim que todo pretendente desiste após o primeiro pensamento. Se há algum mistério escondido na moça, melhor não se jogar, fingir que não leu o jornal pela manhã, ignorar que ela existiu por algum segundo. Da mesma forma, ocorre com a felicidade. Belíssima, doce, de graça. Cheia de mistério, anuncia-se para todos, rodeando os pobres, os ricos, os doentes, os loucos. Todos, menos os covardes. Todos, exceto aqueles que têm medo das surpresas por ela trazidas. A felicidade doa-se a qualquer um que simplesmente acredite nela. Mas vai embora, de vestido preto e véu de luto, como uma moça que acaba de perder o futuro esposo e a esperança, quando fechamos a porta com medo do furto ou da morte. Diz adeus, dá um aceno, “é uma pena que não me aceite em sua vida”, e parte. Ainda há quem queira.
— rio-doce
❝Tá tudo tão neutro, tão nem aí, tão tanto faz. Que se você aparecesse aqui eu nem me alteraria. Já não há vontade de amor, passou, esfriou, morreu. Demorou demais.
— Caio Augusto Leite.
❝Ela era um quadro borrado
um abstracionismo ilegível
que ninguém, em mil anos,
ousaria dizer que entendeu.

Ainda sinto o toque suave
que as cores do quadro faziam
aos meus olhos quando os dois
se encontravam e se perdiam,
ali, por horas à fio.

Ela me levava à qualquer lugar;
estar com ela era estar em qualquer lugar.
Pois paraíso é estar bem em qualquer lugar,
e, em qualquer lugar, eu estava bem, com ela.

Você, agora, é quadro vendido:
até a próxima, boa sorte.
Estou aqui, com foto tua na mão
à te observar. Adeus, meu amor.

— Kévin de Morais | kevolta.tumblr.com

domingo, 26 de maio de 2013

E SE FOR FALAR DE AMOR, CALAREI EM VOCÊ

Você quer falar sobre você ou sobre o amor? Porque se eu for falar sobre o amor, eu posso perder um tanto de tempo falando a respeito de um convidado especial que recusou meu convite. E, caso queira que eu fale de você, terei que deitar no teu colo para conseguir dizer algumas poucas palavras sobre a tua pessoa – ou sobre a tua-pessoa-em-mim, que é a que mais conheço. Ou não. Sei lá. É difícil ser alguém que não conhece a si mesmo e não sabe responder qualquer questionário pessoal e, ainda assim, conseguir expor algumas letras sobre outro ser imperfeito, incompleto e eternamente mutável – você ou o você-em-mim, tanto faz.
Falar sobre o amor é mais fácil. Silêncios oceânicos, geralmente, preenchem as lacunas de um sentimento que por vezes parece ser vazio. Complicado é me calar sobre você e isso te faça ter a ideia de que eu não penso em você ou de que eu não queira te dizer alguma coisa. Porque, você sabe – ou acho que sabe e eu gostaria que soubesse – que eu penso tanto em você que tem vezes que te imito trejeitos tentando ser mais um cado você do que eu, apenas para buscar uma forma de ser você e descobrir se na tua forma de viver há espaço – por menor que seja – para alguém como eu.
Mas você prefere falar sobre o amor, né? Não sei porque as pessoas têm essa mania ridícula de falar sobre o amor e torná-lo coisa tocável, palpável como cartas perfumadas e/ou fotografias felizes. O amor não é isso. O amor é tímido demais para tais demonstrações públicas. Ninguém consegue declarar o seu amor a alguém. A gente fica apenas naquela tentativa vã de materializar em palavras a forma como nos sentimos perto do tal alguém especial que dizemos amar. Mas na verdade, amamos, apenas, o brilho que nos enche os olhos, a arritmia que nos dá e o suor frio que escorre pelas mãos. Amor é saúde com sintomas de doença.
E você? Você é apenas mais uma forma que eu achei para falar de amor. E vice-e-versa. Então, se eu for falar de você, falarei de amor. E se for falar de amor, calarei em você.

Hugo Rodrigues

Enquanto você não chega

Enquanto você não chega, eu aprendo a arrumar minha cama todas as manhãs. Aprendo a arrumar minha vida também. Faço minhas malas, saio da casa dos meus pais, me formo na faculdade, arranjo um emprego e tenho, finalmente, uma vida para chamar só de minha. Eu tomo vergonha na cara, descubro o que realmente são problemas e posso finalmente dizer que devo explicações somente a quem paga as minhas contas: eu mesma.
Enquanto você não chega, eu leio livros que me ajudam a sair da minha bolha de cristal. Eu vejo vidas que me fazem perceber que o mundo não é apenas a segurança do lar da minha infância. Eu aprendo que, para ter um lugar no mundo, eu tenho que ver muito, aprender muito, crescer muito.
Enquanto você não chega, eu crio cicatrizes feias no coração. E aprendo, por mais que doa. E todas sempre doem. Mas é que, para acertar, a gente tem mesmo que passar por uns sufocos. Não dizem que só assim a gente valoriza os momentos de felicidade? Por isso eu sei que vou te valorizar. Os outros já tentaram cumprir o papel de me fazer desacreditar no amor. E, por você, eu acreditei de novo. Por você, eu insisti, mesmo depois das mentiras, das promessas quebradas, dos planos que não deram certo. Por você, eu mantive o espaço vago, mesmo quando tantos fizeram de tudo para que eu acreditasse que deveria trancar meu coração a sete chaves e esconder a chave até de mim.
Enquanto você não chega, eu viro culpada por corações quebrados também. Alimento relações fugazes, que acabam logo que o sol aparece. É que, para entender o amor, eu tenho que ter sentido a força das minhas paixões. Para descobrir que eu quero a calmaria, eu tenho que ter me aventurado em experiências de química, física e contatos de pele. Então, eu agarro, puxo cabelos, abraço forte, e depois digo que não foi nada, que já está na hora de ir, que confundiram as coisas. Porque eu também não sou perfeita....
[...]
E aí, enquanto eu me debato em mentiras que eu escuto, que eu conto, que eu vivo, eu me descubro valorizando a verdade mais do que qualquer outra coisa na vida. Mesmo que a verdade seja que talvez você nunca chegue. Porque, enquanto você não chega, eu cresço tanto que descubro que sei e saberei ser feliz de verdade, não importa o que aconteça. Mesmo se você nunca chegar.

Karine Rosa
Je pense que je t’aime, foi o que ela disse: “Acho que gosto de você.” Ou: “Acho que amo você.” O verbo francês aimer pode significar as duas coisas. E era por isso que ele gostava dela e ao mesmo tempo a amava. Ela falava com ele numa língua que, não importava a quantidade de horas que fosse estudada, não poderia ser totalmente compreendida.
— O Teorema Katherine
❝Se eu tivesse seguido por outro caminho, lido outros livros e conhecido outras pessoas, hoje não seria eu. Se eu tivesse pego um atalho ou virado uma rua acima, minha vida não seria a minha. O mundo não passa de um grande e bonito labirinto de peças de dominó: uma só peça tombada e o resto se curva aleatoriamente até chegar ao fim. Somos movidos por perguntas e, logo após, pelas respostas, as escolhas. Não é a vida que nos leva, nós é que a carregamos, a cada “sim” ou “não” dito diante de uma situação. Em frente ou enfrente? E assim cai a primeira peça, logo a segunda e depois a terceira, até chegarmos na peça que somos hoje. Escolhas, de simples à complexas, podem mudar do sabor do sorvete até nosso futuro inteiro. O fazer ou não fazer decide o ser ou não ser. É por isso que sou assim, um fruto da escolha passada. Moldada à partir do que abri mão e do que dei continuidade. Se eu tivesse tomado outra rua, outra rota, outra direção, talvez não estivesse escrevendo. Talvez não estivesse feliz. Talvez fosse semelhante àquele que julgo hoje. Que tipo de pessoa eu seria se não houvesse vivido o que vivi? Talvez eu nem continuasse vivendo.
— rio-doce
"O amor é uma carta, mais ou menos longa, escrita em papel velino, corte dourado, muito cheiroso e catita; Carta de parabéns quando se lê, carta de pêsames quando se acabou de ler. Tu que chegaste ao fim, põe a epístola no fundo da gaveta, e não te lembres de ir ver se ela tem um post-scriptum…"
— Machado de Assis

sexta-feira, 24 de maio de 2013

“O calendário correu e só ali caiu a ficha dela. Ela não queria mais dar corda naquele relógio sem fim. Já vi gente chorando por ter sido esquecido e gente esquecendo e ter chorado. Mas nunca vi gente esquecendo de que chorar renova o esquecimento, ela era assim. Quem a vê, diz que vive sorrindo mas são todas cúmplices do mundo teatral dela. Ela tentou escrever sua peça para não viver a realidade que a entregaram. Bebeu para esquecer. Aquela ferida que antes tampava com maquiagem, estava agora exposta. Não engoliu choro algum. Parecia uma atriz, ainda em meio expediente, enquanto o público espera uma apresentação decente e ela não esperava o aplauso de ninguém.”

ANA LUÍZA BESSA
“E Clarisse está trancada no banheiro
E faz marcas no seu corpo com seu pequeno canivete
Deitada no canto, seus tornozelos sangram
E a dor é menor do que parece
Quando ela se corta ela se esquece
Que é impossível ter da vida calma e força
Viver em dor, o que ninguém entende
Tentar ser forte a todo e cada amanhecer.
Uma de suas amigas já se foi
Quando mais uma ocorrência policial
Ninguém entende, não me olhe assim
Com este semblante de bom-samaritano
Cumprindo o seu dever, como se eu fosse doente
Como se toda essa dor fosse diferente, ou inexistente
Nada existe pra mim, não tente
Você não sabe e não entende
E quando os antidepressivos e os calmantes não fazem mais efeito”

DADO VILLA-LOBOS COM RENATO RUSSO
“Vou contar o que ela vê nele: Ela vê uma serenidade rara e isso é mais importante do que o Porsche que ele não tem, ela vê que ele se emociona com pequenos gestos e se revolta com injustiças, ela vê uma pinta no ombro esquerdo que estranhamente ninguém repara, ela vê que ele faz tudo para que ela fique contente, ela vê que os olhos dele franzem na hora de ler um livro e mesmo assim o teimoso não procura um oftalmologista, ela vê que ele erra, mas quando acerta, acerta em cheio, que ele parece um lorde numa mesa de restaurante mas é desajeitado pra se vestir, ela vê que ele não dá a mínima para comportamentos padrões, ela vê que ele é um sonhador incorrigível, ela o vê chorando, ela o vê nu, ela o vê no que ele tem de invisível para todos os outros. Agora vou contar o que ele vê nela: Ele vê, sim, que o corpo dela não é nem de longe parecido com o da Daniella Cicarelli, mas vê que ela tem uma coxa roliça e uma boca que sorri mais para um lado do que para o outro, e vê que ela, do jeito que é, preenche todas as suas carências do passado, e vê que ela precisa dele e isso o faz sentir importante, e vê que ela até hoje não aprendeu a fazer um rabo-de-cavalo decente, mas faz um cafuné que deveria ser patenteado, e vê que ela boceja só de pensar na palavra bocejo e que faz parecer que é sempre primavera, de tanto que gosta de flores em casa, e ele vê que ela é tão insegura quanto ele e é humana como todos, vê que ela é livre e poderia estar com qualquer outra pessoa, mas é ao seu lado que está, e vê que ela se preocupa quando ele chega tarde e não se preocupa se ele não diz que a ama de 10 em 10 minutos, e por isso ele a ama mesmo que ninguém entenda.”

— Martha Medeiros.
Eu não acho que seja possível preencher um espaço vazio com aquilo que você perdeu. Não acho que nossos pedaços perdidos caibam mais dentro da gente depois que eles se perdem. Agora foi a minha ficha que caiu: se eu de alguma forma a tivesse de volta, ela não encheria o buraco que a perda dela deixou.
— O Teorema de Katherine

quarta-feira, 22 de maio de 2013

“O amor aparece quando menos se espera e de onde menos se imagina. Você passa uma festa inteira hipnotizado por alguém que nem lhe enxerga, e mal repara em outro alguém que só tem olhos pra você. Ou então fica arrasado porque não foi pra praia no final de semana. Toda a sua turma está lá, azarando-se uns aos outros. Sentindo-se um ET perdido na cidade grande, você busca refúgio numa locadora de vídeo, sem prever que ali mesmo, na locadora, irá encontrar a pessoa que dará sentido a sua vida. O amor é que nem tesourinha de unhas, nunca está onde a gente pensa.”

-Martha Medeiros
Tomara que a gente tenha maturidade suficiente para olhar pra dentro e reconhecer nossas falhas. Tomara que a gente consiga descartar o que não serve sem apego ou drama. Tomara que a gente possa olhar para a frente sem aquela mágoa azeda do que ficou para trás. Tomara.
— Clarissa Corrêa.

segunda-feira, 20 de maio de 2013

“O que aconteceu depois? Nada. Por quê? Não sei, na verdade. Sabe como são esses contatos físicos. A coisa começa de um jeito, meio sem nome, como apenas uma brincadeira, e no fim acaba ficando meio sério porque esse tipo de coisa adulta não deveria ser praticada por duas crianças no quesito “romance”. Não nos apaixonamos, foi isso. Nos demos fantasticamente bem na parte física e mesmo assim decepcionamos nossas almas.”

GABITO NUNES
“Não se iluda com as quantidades, você pode demorar dois dias pra ler um livro que se esquecerá duas semanas depois, assim como pode demorar dois minutos pra ler uma frase que te fará refletir pelas próximas duas décadas. Linhas não definem sentimentos, e a palavra certa é aquela que toca uma parte sua que você nem sabia que tinha.”

SEAN WILHELM

domingo, 19 de maio de 2013

Quem foi que disse
que o dito que eu disse
foi dito na mesmice,
do que digo no ouvido?
Porque você duvida
do que eu digo no ouvido
quando eu digo
que duvido do que digo
quando tô sozinho contigo.
D C Monroe.
 Que chova
Que lave a alma
Que leve as tristezas
Que traga a calma.
Clara Brandão.
As frases perdem seu sentido, as palavras perdem sua significação costumeira, como dizer das árvores e das flores, dos teus olhos e do mar, das canoas e do cais, das borboletas nas árvores, quando as crianças são assassinadas friamente pelos nazistas? Como falar da gratuita beleza dos campos e das cidades, quando as bestas soltas no mundo ainda destroem os campos e as cidades?
Jorge Amado.